quinta-feira, 2 de julho de 2009

ALGUNS PROBLEMAS DA POLÍCIA


Introdução

Rara não são as vezes que diários de notícias escrito e televisado estampam problemas envolvendo policiais e as corporações.
Rememorando o período entre 13 e 18 de agosto do ano de 1990, quando esteve em visita ao Brasil, Sr. John Alderson, ex-Diretor da Scotland Yard (Polícia Inglesa) que naquela oportunidade manifestou sua visão afirmando que um dos males do Brasil é a violência policial, sendo difícil resolver o problema brasileiro com a Polícia dividida em dois blocos distintos, a Polícia Civil e a Polícia Militar, cada uma trabalhando em caminhos próprios e até rivalizando entre si.
Desta sorte analisando algumas considerações feitas por aquele especialista abordarei alguns problemas relacionados à polícia (compreendendo aqui todas as instituições previstas no texto constitucional) que tem se tornado constante na sociedade hodierna.
Os fatos que evidenciam violência policial, corrupção policial, desvio de finalidade e um divórcio entre a polícia e a sociedade, se sucedem interativa e sucessivamente por todo o Brasil, abrangendo todas as corporações.
Lembro-me que o Cel QOPM RR Willian Romão, ex-comandante geral da PMMA se referia aos dois primeiros problemas como os cânceres que corroem a instituição policial militar.
As polícias convivem com problemas semelhantes, apesar de terem origens, experiências e atribuições diversas, sinalizando que a matriz dos problemas é comum.
Estudos diversificados dão ênfase e relacionam os problemas abaixo como os maiores entraves vivenciados pelas instituições.

a. Violência Policial

O efeito da globalização analisados em nosso artigo A VIOLÊNCIA E A CRIMINALIDADE DESAFIANDO O PODER PÚBLICO, escrito em 13/04/2008, aliados aos problemas sociais também referenciados no pré-falado artigo, tem sido acompanhado por crescentes índices de violência e criminalidade e, paralelamente, pela insatisfação da população com a ineficiência da justiça criminal.
Em várias unidades federativa, autoridades têm respondido à população, preocupada com a criminalidade, com algumas políticas que toleram ou promovem graves violações dos direitos de suspeitos de prática criminosa.
Organizações Não Governamentais acusam que nos maiores centros urbanos, policiais simulando defesa própria ou de terceiros, matam muitas vezes sem justificativas, preenchendo freqüentemente falsos relatórios, descrevendo execuções extrajudiciais como tiroteios envolvendo perigosos criminosos e depois levando os corpos de suas vítimas para setores de emergência dos hospitais para que recebam os “primeiros socorros”.
Ao remover os corpos das vítimas do local do crime, violando a legislação brasileira, estes policiais efetivamente eliminam a possibilidade de uma investigação adequada dos casos por parte dos peritos.
Relatórios da Human Rigths Watch, ONG americana, sentencia que em alguns Estados, policiais dão continuidade à abominável prática de desaparecimento forçado utilizada no Brasil durante o regime militar.
Acusam ainda que quando os precários inquéritos sobre incidentes de violência policial, apurados pela própria polícia, chegam ao Ministério Público quase nunca recebem prioridade. Uma vez apresentada a denúncia, as instâncias jurídicas brasileiras, particularmente as da Justiça Militar, não cumprem com a obrigação legal de julgar, condenar e punir policiais violentos. O preconceito contra suspeitos é quase tão difundido na justiça quanto entre as forças policiais e a sociedade em geral.
No caso específico das Polícias Militares, a violência é mais fácil de ser contida, pois ocorre nas ruas, em público, sendo invariavelmente percebida, em contrapartida com as outras instituições, a violência ocorre em suas dependências.
No relatório anual da Human Rights Watch relativo ao ano de 2008 publicado em 14 de janeiro de 2009, no que tange a Violência Policial, dá conta que as áreas metropolitanas brasileiras são assoladas pela violência cometida por gangues criminosas e policiais abusivos. Nessa conjuntura a violência afeta principalmente comunidades de baixa renda e quase 50.000 homicídios ocorrem anualmente no Brasil.
Destaca ainda que a violência policial, incluindo execuções extrajudiciais, é um problema crônico. Assim como abusos também são cometidos por policiais fora do horário de serviço.
Rotineiramente tem se observado nas divulgações levadas a efeito pela mídia que as milícias que controlam várias dezenas de comunidades de baixa renda no Rio de Janeiro também têm policiais fora de serviço entre seus membros.
Assunto trabalhado pela Organização das Nações Unidas, Anistia Internacional, Organizações Não Governamentais, amplamente divulgados na internet, conclui que o problema da violência policial no Brasil encontra sua matriz como parte integrante das ações corriqueiras de combate ao crime e à criminalidade urbana no Brasil.
Assim as políticas públicas implementadas no decorrer da redemocratização do país ainda não alteraram o quadro dessas violações e, pior que isso, nas principais capitais do país, a violência é utilizada como instrumento de combate aos criminosos, o que estimula as torturas e as mortes extrajudiciais.
Não há dúvidas de que o problema é grave, é intolerável a violência desnecessária, até porque a lei admite o uso e a adoção da força necessária por policiais para impelir defesa sua e de terceiro, entretanto condena totalmente a violência policial.
Cabem a todos nós gestores, comandantes em todos os escalões, a fiel observância da lei em nossas ações, coibindo essa mazela que macula procedimentos policiais e coloca em xeque a instituição como um todo.

b. Corrupção Policial

A fragilidade dos instrumentos hierárquicos e disciplinares das corporações policiais, a seqüência de escândalos no dia-a-dia da polícia não pode ser atribuída exclusivamente à fraqueza do ser humano. Sem dúvida a questão é estrutural.
Existe a corrupção instituída e generalizada de que participa instituições policiais, como aquela que é patrocinada pelos banqueiros do jogo do bicho; há a corrupção localizada em unidades policiais, patrocinada por modalidades do crime organizado (como o tráfico de entorpecentes, o furto e roubo de veículos); há a corrupção como prática enraizada de funcionários da polícia, independente da unidade policial em que sirvam.
Existe ainda a corrupção clássica que caracterizam dirigentes e funcionários no manuseio de recursos do Estado em qualquer modalidade de serviço público e em qualquer nível de governo.
Os baixos salários que desmotivam a atividade policial, e que resultam na procura pelos agentes policiais de outras fontes alternativas de remuneração, em prejuízo da produtividade de seu serviço é uma decorrência direta desse problema.
O assunto tem que ser estudado com seriedade para que se encontrem soluções viáveis.

c. Desvio de Finalidades

O problema quase não é percebido pela opinião pública, mas existe e é grave.
Vai desde o uso indevido dos meios materiais, efetivos retirados da atividade policial para atender a interesses menores até ao exercício deliberado de funções policiais que não são exatamente aquelas competentes à Instituição.
O Professor Hely Lopes Meirelles ensina que: “O desvio de finalidade ou de poder se verifica quando a autoridade, embora atuando nos limites de sua competência, pratica o ato por motivos ou com fins diversos dos objetivados pela lei ou exigidos pelo interesse público. O desvio de finalidade ou de poder é, assim a violação ideológica da lei, ou, por outras palavras, a violação moral da lei, colimando o administrador público fins não queridos pelo legislador.”
O desvio de pessoal policial para atividades não policiais agrava a carência numérica, sobrecarrega as direções, interrompe a formação policial que advém em grande parte do exercício de sua função típica.
Destacam-se as assessorias aos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, que absorve significativa quantidade de policiais para atividades das mais diversificadas possíveis, totalmente diferente da formação recebida e que vai sobrecarregar os companheiros que continuam em seus misteres.

d. Divórcio entre a Sociedade e a Polícia

Há um divórcio entre a sociedade e a Polícia, ora pela incompreensão coletiva do papel da Polícia, ora pela reação às violações policiais dos Direitos Humanos, ora pela falta da ocupação de suas atividades no seio das comunidades onde estão inseridas.
A sociedade elabora concepções sobre o crime, o criminoso e terapias de controle social.
Práticas policiais condenadas pelos defensores dos Direitos Humanos podem corresponder a expectativas populares de combate adequado ao crime.
Nessa ótica é evidente que a popularidade de uma prática não a torna moralmente justificável - mas interpretações ambientais de objetivos e meios eficientes de políticas de controle social afetam em alguma medida a realidade organizacional da polícia.
Os Direitos Humanos são ameaçados por concepções populares de ordem que identificam em estranhos, drogados, jovens e outros tipos, os objetos de controle policial: o absolutismo moral conspira contra os Direitos Humanos de membros individuais de grupos minoritários de excêntricos, adolescentes, prostitutas e que devem ser, entretanto protegidos da tirania das maiorias, inclusive pela polícia.
A garantia institucional dos Direitos Humanos é precária quando - ao contrário da sabedoria convencional que assume como fato a crença de que a polícia se situa ideologicamente à direita da sociedade e esta, apóia fortemente práticas policiais desviantes das regras de controle social-democráticos.
A sociedade pode deseducar a polícia através de pedagogias diversas - exigindo dos policiais a suspensão dos Direitos Humanos na restauração da ordem pública; privando a polícia dos recursos adequados e desempenho eficiente na redução das taxas criminais (incluindo salários simétricos às responsabilidades e riscos próprios do trabalho policial); condicionando esse trabalho aos interesses particularistas dos donos de poder social e político. Mas a garantia dos Direitos Humanos entre nós depende, também, de alterações nesses processos.
Nessa esteira de entendimento, vários são os estudiosos que afirma que as instituições só se dispõem a adotar processos de mudança quando: A legitimidade da sua missão é questionada; seus valores são abertamente desafiados; sua posição perante a sociedade é abalada por revelações de corrupção, escândalo ou abuso de poder; seu monopólio é ameaçado ou invadido por competidores; a sobrevivência institucional é ameaçada; o desempenho funcional estiver muito baixo; em caso de ampliação, fusão ou diversificação; após período de crescimento acelerado, para fazer adaptações corretivas.
Assim para garantir o sucesso das mudanças organizacionais, os modelos precisam ser concebidos: De maneira adequada; corretamente dimensionados e prescrevendo a dosagem de mudança que o sistema é capaz de suportar.
Só assim então teríamos uma mudança de paradigmas capaz de iniciar uma nova relação.
A interação entre a polícia e a sociedade é fundamental pela inter-relação existente.
A doutrina universal, presente com uma ou outra modificação, não essencial, em todas as obras de Direito Administrativo, conceitua polícia como atividade administrativa que, valendo-se da coerção, ora tem por finalidade prevenir a manutenção da ordem pública, através da limitação da liberdade individual e coletiva, ora se destina a promover a paz, a tranqüilidade pública, através da proteção e socorro comunitários.
A polícia tem um papel social muito importante na sociedade e existe não só para servir como termômetro da sociedade, mas também para promover o bem comum, criar as condições necessárias para que a vida, e particularmente a vida humana, se manifeste em todo o seu esplendor e riqueza.
Destarte, a polícia é uma instituição de natureza comunitária, caracterizada como força-dinâmica do Estado-Sociedade, para desenvolver ações preventivas e repressivas, com a finalidade de proteger as pessoas e seus bens, assegurando-lhes a tranqüilidade necessária para viver em paz.

Conclusão

Os problemas são polêmicos e alguns policiais o encaram como falta de espírito de corpo, desnudar “situações consideradas interna-corporis”.
Diferentemente do entendimento desta postura, acredito que a polícia como instituição social e que existe para intermediar conflitos, necessita cada vez mais aproximar-se das mesmas comunidades integrantes da sociedade onde desenvolvem seus serviços, pois é esta interação e inter-relação que vai ajudar a encontrar soluções para os graves problemas apontados.

Bibliografia

http://www.hrw.org/en/world-report/2009/brasil. Violência Policial. Acessado em 16/06/09 às 23h30m.
http://www.observatoriodeseguranca.org/relatorios/policial. Violência Policial. Acessado em 16/06/09 às 23h45m.
POLÍCIA MILITAR DO MARANHÃO. Programa de Polícia Comunitária, São Luís,1996.
________. Polícia Comunitária: Conceitos e Doutrinas, São Luís, 2005.

São Luís-MA, 02 de julho de 2009.

Ten Cel QOPM Carlos Augusto Furtado Moreira
Chefe do Estado Maior do Cmdo do Policiamento Regional 1

Um comentário:

  1. Foram postados os seguintes comentários no http://www.forumseguranca.org.br/artigos/alguns-problemas-da-policia

    Sobre o tema que você citou: divórcio entre polícia e sociedade, escrevi um texto e gostaria que você lesse.
    http://www.forumseguranca.org.br/artigos/jornalista-nao-e-policial

    No seu artigo li que um dos motivos desse divórcio é a "incompreensão coletiva do papel da Polícia", bom, eu gostaria de compreender corretamente qual é o papel da polícia, eu discordo de algumas das suas definições,apesar de considerar o artigo excelente, leia meu artigo e entenderá.
    Gustavo Serrate • Brasília (DF) • 3/7/2009 19:51

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    Prezado Carlos Augusto,
    Em relação ao comentário do Sr. John Alderson, ex-Diretor da Scotland Yard, citado no texto, referindo-se à divisão da polícia brasileira em dois blocos distintos, Polícias Civil e Militar, como obstáculo para resolução da violência policial, ouso discordar. Não acho que seja problema a divisão das polícias em si, mas, sim, a divisão de atribuições dessas instituições, pois a ampliação das competências de ambas, cabendo às duas o policiamento ostensivo e investigativo, o chamado ciclo completo de polícia, acabaria por minimizar, ou até pôr fim, nos antagonismos ainda existentes entre as duas coirmãs.
    Forte abraço,
    André Abreu de Oliveira • Salvador (BA) • 4/7/2009 20:47

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    Prezado Carlos Augusto,
    Terminei esquecendo de dizer: parabéns pelo excelente artigo!
    Forte abraço,
    André Abreu de Oliveira • Salvador (BA) • 4/7/2009 20:59

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